Por Paulo Cabral Tavares - advogado
Quando eu era
menino, a gente pescava piabas com tubos de candeeiros, no rio de Contas. Sim,
não havia energia elétrica e todo mundo tinha, pelo menos, um candeeiro em casa
que funcionava com querosene, com tubos de vidro. Quando um destes tubos
quebrava, trincava ou por alguma razão se tornava imprestável se fazia uma
espécie de ferramenta para pescar piabas. Tapava-se um lado com pano e se
colocava farinha dentro do tubo, as piabas entravam e não havia espaço para
fazer a volta, ficando presas ali dentro. Eram poucas. Eu acho que não ficavam
dentro do tubo mais do que quatro piabas, quando muito.
Nós tínhamos uma
vizinha que era uma verdadeira rival de minha mãe no sentido de divergirem de
quase tudo. Discutiam até acerca da idade minha com o primeiro filho dela.
Afirmando que um era mais velho do que o outro.
Como a piaba da
vizinha é sempre maior e mais bonita, eu furtei as piabas que estavam dentro do
tubo de candeeiro dela. Coisa de menino. Se bem me lembro devia ter uns dez
anos. Não deu outra, e a senhora veio se queixar de minha mãe dizendo que eu
tinha roubado as suas piabas. Míseras três piabinhas de nada. E se não me
engano me chamou de ladrão. Tomei a maior surra de minha vida. Não pelas
piabas, eu acho, mas pela humilhação que eu proporcionei à minha mãe de ser
afrontada pela rival e ter de engolir que o seu filho mais velho era ladrão de
piabas. A atitude de minha mãe era o esperado que ela fizesse naquele tempo:
“disciplinar” exemplarmente os filhos para que não se tornassem pessoas ruins.
Eu contei isto
num comício quando candidato a prefeito. Para demonstrar a forma, como menino
pobre eu fui criado. A exposição tem as suas vantagens, mas também paga seu
preço. Um camarada que estava no comício, opositor, certamente, comentou em voz
alta que eu não prestava mesmo para ser prefeito, pois era ladrão desde menino.
Quase deu confusão.
Certamente é um
episódio que não enobrece a minha biografia. Mas agora vem o Papa Francisco
para confessar de público que também afanou um crucifixo de outro padre, seu
colega, no caixão deste, por ocasião do enterro. É muita coragem de um líder
religioso divulgar uma coisa destas. Mas ao contrário, em vez de diminuir o seu
conceito perante mim, ele cresceu mais ainda.
Parece que o seu
objetivo é demonstrar que o papa é uma pessoa como todos nós. Capaz de erros e
acertos. Que pode cometer os seus pecados. Que não é infalível como prega a
doutrina. Que tem momentos de extrema fraqueza. E que é capaz de vir a público
pedir perdão por um pecado menor como furtar um crucifixo. Antes um cidadão
humano capaz de uma coisas destas, que certamente purgou durante toda a sua
vida, tanto que carrega até hoje o crucifixo ao alcance da mão, para quando a
coisa apertar um pouco, ele o tocar e se lembrar de sua fraqueza e se sentir
encorajado a não mais fraquejar. Antes assim do que ter aparentemente uma vida
de santo sem que ninguém saiba do que se passa nos porões das almas de muito
líder que existe por aí.
Parabéns
Francisco. Eu levei uma surra danada. Mas você deve ter apanhado
espiritualmente muitas vezes durante a vida, nos momentos em que você exercia o
seu sacerdócio e se lembrava do episódio. Até que foi capaz de fazer esta
penitência pública. Purgar o seu pecado perante todos os seus liderados.
O meu pecado foi
menor. Mas duvido que eu seja uma pessoa santa como você é. Certamente todos
nós já lhe perdoamos, pois, temos a certeza que Deus já lhe perdoou há muito
tempo.
Ubatã, 20 de março de 2014.
Paulo Cabral Tavares